A Queda

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Sim, confirmo aquilo que ontem escrevi de forma potencialmente instantânea: trata-se do maior acontecimento proeminentemente político do pós 25 Abril. Explicito da seguinte maneira, com outros dois casos. Camarate mexeu com as desconfianças e fermentou a teoria da conspiração, uma ideia quase maquinal que todos temos, de que o monstro não é ninguém e são todos, como se de um cabo das (nossas) tormentas se tratasse e que por onde tendo de passar, nos engole. Numa perspectiva diacrónica oposta, temos a entrada para a CEE em 86. Aí invade-nos uma ideia de modernidade e de que a Europa nos deu, numa caridade sublinhada de reverência, aquilo que nós portugueses tendemos a achar nosso, uma dignidade nacional histórica. Como se pudesse ser conservada de D.Afonso Henriques até ao menino que nasceu agora mesmo, do Mestre de Avis à esquerda intelectual, de D.Manuel I até aos Jerónimos, do Marquês de Pombal até ao grande estadista que julgamos sempre existir e estar escondido na medíocre vida política. O sonho comanda a vida íntima com encanto e a vida pública com uma desfaçatez imprópria. Não somos esse país, não somos os portugueses que já fomos, não temos esquerda, apenas se passeia nas frases feitas, o Jerónimos estão gastos, realmente gastos, e duvido desse estadista com destino Sebastianista.


O que nos sobra? A realidade sempre crua, aqui e ali desnudada. Como no caminho natural do desaparecimento, em plena época da “décadence” tão própria dos destinos tomados pelo Niilismo. Assim é hoje Portugal. Antes da ruína, ainda tempo para uma de duas, se não duas cruéis realidades per si. Uma lamentável comunicação social politicamente empenhada e um Primeiro-ministro íntegro. Uma comunicação social transparente e um Primeiro-ministro corrupto. Um pouco de cada. Certo está que não sabendo em que poder acreditar, tenho náusea. Mais certa é a instalação da dúvida no seio público, com que sem pudor, não irrompem medidas nem tomadas de posição. Fomos tomados por uma banalidade sórdida: a corrupção, fonte de toda a usurpação de poder legítimo, não choca, nem sequer imprime mudança! Tudo numa vexatória classe politica onde os representantes do povo, mais se assemelham a timocratas nepotistas que logicamente, “albardam” a lei à sua vontade.


Que fazer? Sócrates está moralmente compelido a colocar o seu lugar à disposição, ainda que sendo intocáveis os seus direitos de reclamação de inocência. A tão pesada factura obriga a moralidade do cargo exercido. Como alto funcionário público ele defende o interesse do Estado e como terceiro na hierarquia de Estado representa a Nação. Com tão importantes distinções, só equiparadas às responsabilidades que daí advêm, só uma postura servil é adequada ao Homem Bom, e consequentemente ao Bom Homem de Estado. Não é fácil defender esta postura. É preciso amar a Rectidão acima de qualquer outra coisa. Penso no como poderá admoestar um homem inocente sair do seu cargo. Ainda assim, vítima de um acto vil, deve orientar a sua postura para os interesses do Estado e da Justiça. Não deixar que à semelhança do seu nome, a Nação seja conspurcada. Provar por todos os meios a sua inocência. Esperar que a Justiça puna severamente todos os culpados, como se de crimes contra toda Nação se tratasse. Se isto não é possível
é porque o Estado não é de bem e a Justiça não funciona. Para que um Estado não seja de bem e a Justiça não funcione bastam duas coisa: corrupção no Estado e falta de Homens Bons a prover Justiça.

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