Fumo

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"E era por isso que Litvínov estava tão sereno e simples, olhava à volta tão confiante. Porque a sua vida estava tão claramente disposta à sua frente, porque o seu destino estava determinado e porque estava orgulhoso desse destino e satisfeito como se está satisfeito de um trabalho feito pelas nossas próprias mãos."

"... durante dez séculos a Rússia não produziu nada, nem em governo, nem em leis, nem em ciência, nem em arte, nem mesmo em artesanato... Mas espere, tenha paciência: tudo virá. E porque virá, posso perguntar? Porque nós, pessoas educadas - não prestamos para nada, mas o povo... oh, é um grande povo! Vê aquele camponês? Dali é que há-de vir tudo."

"Dêem-nos um desenvolvimento normal! Mas aonde é que o vamos buscar, quando a própria primeira acção histórica do nosso povo - chamar príncipes do outro lado do mar para o governar - já é irregular, anormal e repetida em cada um de nós até hoje?"

"... aqueles dias em que, ainda querendo duvidar e tendo medo de acreditar, com um êxtase palpitante, um pouco receoso, via como surgia aquele amor, grande e dominando irresistivelmente tudo à sua frente, produzindo por fim uma inesperada felicidade."

"Na verdade ele não estava nada a pensar assim e apenas repetia maquinalmente aquelas frases batidas,, como se quisesse ver-se livre de outros pensamentos mais angustiantes."

"Começou a censurar-se impiedosamente mas logo se dominou. «Isto é fraqueza», pensou. «Agora não é o momento para censuras Tánia é a minha noiva, confiou no meu amor, na minha honra, estamos ligados para sempre e não podemos, não devemos separarmo-nos». Imaginou vivamente todas as qualidade de Tatiana, pensou nelas, contou-as; tentou despertar em si o amor e a ternura."

"«Sim Tánia, estou perdido. Todo o meu passado, tudo o que me é caro, tudo o que vivi até agora - está perdido para mim, tudo está destruído, arruinado, e não sei o que me espera amanhã. Acabas de me dizer que deixei de amar-te... Não, Tánia, eu não deixei de amar-te, mas foi outro sentimento terrível, irresistível, que caiu sobre mim torrencialmente. Lutei enquanto pude.»"

"«Fumo, fumo», repetiu ele algumas vezes: e, de súbito, pareceu-lhe que tudo era fumo, tudo, a sua própria vida, a vida russa - tudo o que era dos homens, e especialmente tudo o que era russo. «Tudo fumo e vapor», pensou «tudo parece mudar continuamente, em toda a parte novas formas, acontecimentos, mas no fundo é tudo o mesmo; tudo corre tudo se apressa para qualquer parte - e tudo desaparece sem um rasto, nada atingindo; o vento muda - e tudo se lança na direcção oposta, e de novo começa o mesmo jogo incessante, ansioso e fútil.»"

"O velhote ficou contente por ver o filho, na medida em que se podia alegrar um homem já com a vida acabada."

Excertos do romance Fumo, de Ivan Turguénev


O típico romance de Turguénev é um excelente compêndio da vida aristocrática de São Petersburgo e da Rússia da segunda metade do século XIX, onde já pontificam aquilo que seriam as futuras tendências comunistas e populares Russas do século XX. Ademais, o livro retrata ad nauseam a obsessão francesa da nobreza e a sua futilidade ociosa, que transtorna o homem questionador. Mas este é sem dúvida um romance de cânone. A diagnose política e social serve-nos apenas de brilhante pano de fundo a uma história de amor febril e dramática - típica da literatura Russa - que se estabelece a partir do reencontro de dois antigos enamorados. O mote é precisamente esse: o desarranjo emocional e psicológico provocado pelo encontro, que surge na figura de Litvínov como um regresso inconveniente ao passado. Um homem que redesenha a sua vida e que se confronta com o desejo reacendido do passado. Num triângulo amoroso entre o passado e o presente, o final acaba aberto e morno - uma sensação sublime de banalidade, talvez - oferecendo uma vivacidade ainda mais real a um romance já de si robusto. Fez-me lembrar subtilmente a Insustentável Leveza do Ser, e é o melhor romance que li sobre amores do passado.

O Terceiro Reich

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"Quando da varanda observei que a grande massa dos banhistas empreendia a retirada para os hotéis e para os parques de campismo, desci à praia. Aquela hora é triste e os banhistas são tristes: cansados, fartos de sol, viram o olhar para a linha de edifícios como soldados antecipadamente convencidos a sucumbir; os seus passos cansados que atravessam a praia e o Passeio Marítimo, prudentes, mas com um toque de desprezo, de fanfarronice diante de um perigo remoto, a sua peculiar maneira de se meterem pelas ruas laterais onde procuram imediatamente a sombra, conduzem-nos directamente - são uma homenagem - ao vazio."

"Na sua voz noto rancor e tristeza; a minha explicação, conciliadora, só lhe causa desprezo."

"- Quando morreres, Udo, serás capaz de dizer «volto ao sítio de onde venho: o Nada».
- Quando uma pessoa está a morrer é capaz de dizer qualquer coisa - respondi."

"- E que é ser um alemão?
- Não sei exactamente. É, à partida, algo difícil. Algo que temos esquecido paulatinamente."

"O que é que eles têm a ver com este hotel que cai aos bocados? Nada, mas ajudam: confortam. Prolongam o adeus até à eternidade e fazem com que recorde velhas partidas, tardes, noites, das quais só resta não o triunfo nem o fracasso, mas um movimento, uma finta, um choque, e as palmadas dos amigos nas costas."

"E o que é que aconteceu?, perguntei eu, surpreendido. Nada. Beijou-te? Tentou, mas dei-lhe uma bofetada. Ingeborg e eu rimo-nos muito, mas depois a mim fez-me pena."

Excertos de O Terceiro Reich de Roberto Bolaño

Uma personagem principal confundida, desinteressada, introspectiva e amoral, envolta numa linha narrativa - que se constitui sob a forma de diário - absurda, sarapintada por personagens enigmáticas. Eis O Terceiro Reich de Bolaño; um livro vincadamente da escola absurdista ou surrealista, com um vocabulário simples, onde o principal foco de interesse se circunscreve ao narrador e ao seu jeito errático, passando levianamente sobre os acontecimentos, demasiado aborrecido para especular sobre quaisquer consequências. Infelizmente, a história acaba por ser, também por isso, um pouco pobre e repetitiva, e salvo raras excepções, nunca alimenta um acontecimento que nos prenda a mais de dez ou vinte páginas. Enfim, uma obra com uma mensagem estética e literária - iconoclasta face a Garcia Marquez - muito definida mas que, sem o enredo e o detalhe psicológicos que se exigem deste estilo, fica muito aquém de Camus, Sartre, Nietzsche ou Dostoievski, grandes escritores/pensadores neste registo.

O Vermelho e o Negro

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"Sentia-se demasiado feliz para ver perigo fosse no que fosse. Ingénua e inocente, nunca esta excelente provinciana torturara a sua alma para tentar extrair dela um pouco de sensibilidade para qualquer nova forma de ventura ou infelicidade."

"Desta vez, a sensata Madame Derville achou a prima muito menos alegre, mas muito mais feliz."

"É este, infelizmente, o mal de uma civilização excessiva! Aos vinte anos, a alma de um jovem com alguma educação encontra-se a mil léguas daquela felicidade sem a qual o amor não passa, na maior parte das vezes, de um penoso dever."

"Julien sentiu que o menor raciocínio a irritava, em vez de a acalmar. Ela via na linguagem da razão como que a linguagem do inferno."

"Tinham então entusiasmos de verdadeira loucura. Aos olhos dos outros, essa felicidade teria parecido maior. Mas já não tinham a serenidade deliciosa, a felicidade sem nuvens, a fácil ventura das primeiras épocas dos seus amores quando o único receio de Madame Rênal era o de não ser suficiente amada por Julien."

"Entre os fidalgotes de Verriéres e das vizinhanças inscritos no registo dos irmãos contribuintes, segundo o montante das suas ofertas, por mais de uma vez o nome de Monsieur de Rênal ocupara a última linha. Em vão, ele alegava não ganhar nada. O clero não brinca com assuntos desta natureza."

"A orientação habitual do século XIX é esta: quando um homem poderoso e nobre se depara com um homem corajoso, mata-o, exila-o, prende-o ou humilha-o de tal maneira que o outro comete o disparate de morrer de sofrimento."

"(...) Prevejo que vais ter uma carreira difícil; noto em ti qualquer coisa que ofende a vulgaridade. A inveja e a calúnia perseguir-te-ão sempre."

"Na província, se nos acontecer um acidente ao entrarmos no café, o simples criado que lá trabalha interessa-se por nós; mas se esse acidente nos causar algum melindre ao amor-próprio, é capaz de repetir dez vezes, ao mesmo tempo que nos lamenta, a palavra que nos faz sofrer. Em Paris, têm a delicadeza de ocultar o rosto para se rirem de nós, mas seremos sempre uns estranhos para eles."

"«Já não ridículo - dizia monsieur de La Mole - num país onde existem dois partidos.»"

"O amor imaginado tem sem dúvida mais espírito do que o verdadeiro amor, mas só por momentos atinge o entusiasmo; tem demasiada consciência de si e está sempre a julgar-se; em vez de perturbar o pensamento, constrói-se de pensamentos."

"Quando o ser humano cai no último abismo da desventura, tem como derradeiro recurso a coragem."

"Sofria muito mais profundamente durante a minha primeira viagem a Estrasburgo, quando me julgava desdenhado por Mathilde... E poder dizer que desejei com tanta paixão esta intimidade perfeita que hoje me deixa tão frio!... De facto, sinto-me muito mais feliz sozinho do que quando essa bela mulher partilha a minha solidão...»"

"«Não, o homem não pode confiar no homem.»"

Excertos da obra O Vermelho e o Negro de Stendhal

Obra fabulosa no capítulo psicológico sobre um jovem seminarista e preceptor; de hipocrisia torpe, filaucioso e astuto, cuja inteligência e conflito interior nos é tão admirável que é impossível não nutrir simpatia por ele. No fundo, é disto que o romance sobre Julien Sorel nos trata. Um Romance enquadrado historicamente na ressaca Francesa de Napoleão, algures nos anos de luta entre os Liberais e os Ultras em França, onde a consciência social é vincada, tanto no carácter e atitudes das personagens - em especial em Sorel, no Maire e em Mathilde -, como na descrição dos espaços e acontecimentos.

Com uma escrita muito rica e densa, o livro tem um magnetismo raro em comparação com outras obras da apelidada "Literatura Pesada". Se por um lado temos descrições sublimes sobre os sentimentos das personagens, e até sobre as especulações e conjunturas que fazem entre si, por outro temos uma história rectilínea e imprevisível, sem precisar do cinematográfico
suspense, tão em voga nos dias de hoje.

Este
Roman à thése toca em todos os pontos que um Romance secular deve tocar. Amor, erotismo, sociedade e política estão lá; e até a consciência artística, um pouco escondida (por vezes fica a impressão que Stendhal não queria especificar) comparece de forma competente, numa obra onde são pontificadas as vantagens da província face à capital. Uma obra cimeira dos triângulos amorosos, com a carga psicológica de um Dostoiévski, nas mãos de um narrador irrepreensível como é Stendhal.

A Fábula

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"...fora permitido ao filho alistar-se no dia seguinte, e em Agosto foi enviado para a Bélgica e passadas três semanas já fora dado como desaparecido em Mons, e isso foi aceite por todos excepto pelo pai, que pediu à firma de advogados uma licença sem vencimento para sair e se alistar, e estes concederam-na por que pensaram que ele nunca conseguiria ser aprovado nos exames médicos. Oito meses depois, também o pai estava em França. Um ano depois ainda estava a tentar, primeiro conseguir uma licença para se ausentar; depois, quando isso falhara, a tentar a transferência para alguma unidade suficientemente próxima de Mons para procurar o filho, embora já se tivesse passado muito tempo desde que se referira a ele, como se tivesse esquecido o motivo por que estava ali e se lembrasse apenas do destino..."

"A guerra é um episódio, uma crise, uma febre cujo objectivo é livrar o corpo dessa mesma febre. Assim o objectivo da guerra é acabar com a guerra. Sabemos disso há seis mil anos. O problema é que demorámos seis mil anos a aprender a fazê-lo."

"Porque eles não acreditavam que a guerra estivesse terminada. Decorria há demasiado tempo para cessar, para acabar, de uma noite para a outra, com um mero aviso, e daquela maneira. A guerra limitara-se a prender-se em si mesma; não os homens envolvidos nela, mas a guerra em si, guerra, insensível e até desatenta à angústia, à carne rasgada, a toda a mesquinha vaga e revoada de vitórias e derrotas como o enxamear e rodopiar de insectos..."

"...três mil homens que tinham salvo a França e o mundo iriam perder as suas vidas, não no próprio acto, mas apenas depois do facto, de modo que, para homens que tinham salvo o mundo, o mundo que tinham salvo não merecia o preço que tinham pago por ele..."

Excertos da obra A Fábula de William Faulkner

A aclamada obra de Faulkner, vencedora do Pulitzer e do National Book Award, chegou-me às mãos numa edição relativamente recente da Casa das Letras, que me convenceu, muito por culpa da chancela de Nobel que o autor carrega. Nestas coisas da leitura, vou tendo os meus princípios. Um deles é desconfiar da literatura Norte-Americana. Para o caso, não fez mal; arrisquei. Foi talvez por escolher um obra multi-premiada que tenha arriscado, mesmo sem nunca ter lido Faulkner anteriormente.

A primeira impressão foi desafiante. Uma leitura densa, em jeito de romance histórico, um tanto desligado e de parágrafos prolixos. Nada que assustasse a minha tolerância; que é coisa de 50 a 70 páginas, mas na verdade, o livro nunca mudou. Foram 330 páginas de boas passagens, desusadamente introspectivas para um escritor não Europeu - e este é um ponto que saúdo -, sem que a história me parecesse cabalmente una, nem tão pouco premeditada. Ou seja, se por um lado é bom haver um livro bem escrito sobre a Primeira Guerra Mundial, tão esquecida em função da Segunda, por outro lado é uma pena a lógica narrativa tão intrincada, de onde dificilmente se apanha o fio condutor.

Confesso que o fim não me deu qualquer prazer, antes alívio, mas certamente estarei em desacordo com quase todos os que lerem a obra, e por isso, em consciência, aqui fica a sinopse do editor.

Súplicas Atendidas

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"A verdade é que raramente estou com a pessoa com que estou, por assim dizer; e tenho a certeza de que muitos de nós, até a maior parte, partilham esta dependência de um cenário interior, fragmentos eróticos imaginados e lembrados, sombras irrelevantes do corpo por cima ou por baixo de nós - o nosso espírito aceita estas imagens aquando do orgasmo sexual, mas exclui-as logo que a nossa animalidade foi saciada, porque, independentemente do nosso grau de tolerância, esses fantasmas são insaciáveis aos olhos maldosos dos espias que nos habitam."

"Como é que eu posso, quando uma senhora destas não me deixa concentrar em matérias mais excitantes do que os seus grunhidos?"

"Tenho um amigo que não aprecia as mulheres apesar de não ser homossexual. Costuma dizer-me: As únicas mulheres com quem me amanho são a Sr.ª Punho e as suas cinco filhas - é asseada, nunca faz cenas, é de borla, fiel e está sempre à mão."

"Pode-se argumentar que mesmo as pessoas mais decentemente acasaladas foram, de início, atraídas pelo príncipio da exploração mútua - sexo, protecção, ego saciado..."

"«E agora», disse num tom surpreendentemente casual, «diga-me o que espera da vida»."

"Claro que os homens têm momentos adultos de vez em quando, dos quais a morte é o mais importante. A morte põe certamente o miúdo traquinas em fuga e deixa o que resta de nós inerte, sem vida, mas puro como a Rosa Branca."

"(...) tudo seria meu no dia em que Milhões com Insónias fosse publicado.
Excepto que nunca foi."

"Tânger é uma peça branca de escultura cubista na encosta em frente da baía de Gibraltar. Desce-se do cimo da montanha, através de um subúrbio para a classe média salpicado de feias vivendas mediterrânicas, para a cidade «moderna»..."

"Deu-se então conta de que possuía centenas de compinchas, mas nenhuns amigos, daqueles a quem se pode telefonar às três da matina."


Excertos de Súplicas Atendidas de Truman Capote


A dissimulada biografia inacabada de Capote é um livro desassombrado sobre uma vida boémia e, em todas as direcções, exagerada. A linguagem clara e directa dá à narrativa um divertimento suplementar e, apesar de em nada se assemelhar ao "romance de cordel", prende a atenção do leitor. Para quê? Para nada. Peripécias avulsas num livro brutalmente interrompido pela morte do seu escritor. É-me aliás estranho conceber a edição de um livro que, em momento algum faz menção de acabar, um pouco como um Homem Sem Qualidades de Musil, com a diferença que aqui se nota claramente que o projecto está interrompido, enquanto que na obra de Musil, o projecto é mesmo infinito. Voltando a história, pode-se esperar o conto desconcertante da vida de um escritor errático, de índole travessa, que deliciosamente se cruza com personagens reais como Sartre, Camus ou a Duquesa de Windsor. Enfim, linhas que divertem muito, o que já de si é uma grande vitória contra a dita literatura "mais pesada".

Uns poemas na televisão

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Saúdo o conceito e a forma como ele aparece aqui vendido na televisão privada. À especial atenção dos interessados o último poema.

Europe à la carte

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"Não devíamos esperar que fosse a Europa que nos desse um futuro."

Ramalho Eanes

À consideração da intriga benevolente

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Oh lááá...

O retrato exacto disto

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O retrato feito nos primeiros 20 minutos deste vídeo são de triste antologia. Subscrevo totalmente, e a falácia da nossa putativa Esquerda em Portugal, de politicas de conteúdo tartamudeado entre palavras excelentes, está escarrapachada no minuto 12 deste vídeo. Isto é serviço público.

A Estrada Real

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"- Quem se mata corre atrás duma imagem que se formou de si próprio; ninguém se mata senão para existir."

"Desconcertado por sofrer, não só pela morte daqueles que amava, mas ainda pela de uma mulher que não amava, suportou a sua morte, quando ela chegou, com uma resignação desanimada."

"-Nunca se faz nada da vida.
- Mas ela faz qualquer coisa de nós.
-Nem sempre... Que espera da sua?
(...)
-Creio que sei sobretudo o que nã espero dela...
-Cada vez que teve de optar...
-Não sou eu quem opta: é o que resiste."

"Porque é que trabalhavam? Para ganharem consideração. (...) A submissão à ordem do homem sem filhos e sem deus é a mais profunda das submissões à morte..."

"Não sabe o que é o destino limitado, irrefutável, que cai sobre um homem como o julgamento sobre o prisioneiro: a certeza de que se será isso e não outra coisa, que se terá sido isso e não outra coisa, que o que não se teve, nunca se terá."

"É quando entra em declínio que uma pessoa se deve matar, mas é precisamente quando se entra em declínio que se volta a gostar da vida..."

"Você sabe tão bem como eu que a vida não faz o menor sentido: não é por se viver só que se escapa à preocupação do seu destino..."

"-Não é para morrer que penso na minha morte, é para viver."

"Agora, não há nada pior que aquilo que era a esperança.

"Sentiu furiosamente o desejo de disparar sobre ele, como se só o assassínio lhe tivesse permitido afirmas a sua existência."

Excertos da obra "A Estrada Real" de André Marlaux

Livro de aventuras inspirado nas florestas do Sião e no espírito tribal das gentes da área de Angkor-Wat, Malraux usa dos seus conhecimentos da área - onde de facto viveu -, para exarar este livro de pendor profundamente humanista. Esta obra, escrita três anos antes de A Condição Humana, é talvez o prelúdio do seu conteúdo. Com uma história linear, ainda que confusa no estilo, a narrativa vale sobretudo pela descrição agreste da floresta e dos ambientes húmidos das floresta do Sião, nas regiões hoje de Laos e Cambodja. Também nas personagens não se estabelece uma grande teia, vivendo-se invariavelmente na dupla que move a acção. Por isso, acaba por ser o conteúdo humanista que sobressai, particularmente na construção de diálogos quase impossíveis fora do mundo literário. Uma imprecisão realística que muito valoriza o livro, pois este, na minha opinião, apenas impressiona pelo exegese filosófica que faz da morte e da vida (parece-me ser esta ordem naturalmente invertida a correcta neste caso). A Estrada Real é um livro sobre a morte, a fraqueza da condição humana, e a força de, na vida absurda, haver uma morte pacificada.

Marginalizar as ilhas

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Observando a composição das listas para a Assembleia da República, observo, já com pouca estupefacção - miserável sinal dos tempos -, que Alberto João Jardim será o cabeça de lista pelo evidente PSD ao círculo eleitoral da Madeira, seguido de perto na peugada por Ricardo Rodrigues que, em idêntica posição, se apresenta, com a mesma elementaridade, pelo PS no círculo dos Açores.

As gentes das ilhas irão, como bons cidadãos, escolher entre as escolhas. Na Madeira, um cabeça de lista que não assume o cargo não comporta já, qualquer novidade. Nos Açores, eleger-se-á aquele que foi um dos braços armados do governo na AR.

Força nisso.

Literatura low-cost em tempos de FMI

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À atenção dos interessados. Bons livros, de autores mais ou menos controversos, ao preço acessível, próprio das colecções. Por vir atrasado, escapou-me o primeiro volume, mas ainda o vou tentar resgatar. Ter A Mãe, O Castelo ou Três Mulheres por 5,95€ só pode ser bom negócio.

Património

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"Louie Chesler está num hospital, a urinar sangue. Ida Singer não vê quase nada. Milton Singer não pode andar e está numa cadeira de rodas. Turro - lembras-te do Dick Turro? - tem cancro, coitado.(...) Conseguia, assim, não pensar inteiramente no seu tumor."

"A morte de um progenitor é horrível. Quando a minha mãe morreu, eu não fazia ideia de que me ia sentir como me senti. Metade, ou mais, da vida desaparece."

"- Era um merdas e um falhado e queria que eu também fosse um falhado. A miséria adora companhia."

Excertos de Património de Philip Roth

Um não-romance, obra biográfica romanceada; este é o tributo de Roth ao seu próprio pai. Confesso que poderei ter escolhido mal. Isto não é o protótipo de livro com que se dê o tiro de partida para qualquer escritor. Ainda assim, o livro segue o aspectos gerais que vejo em Auster ou até mesmo em Truman Capote. Resumindo, a literatura americana não me entusiasma por aí além. Injusto? Talvez, e Roth é um eterno candidato ao Nobel, mas as linhas soam sempre mais ao menos ao mesmo. A uma escrita escorreita mas demasiado despreocupada, onde o escritor entra em nós não como um ente genial ou um amigo de longa data a precisar de desabafar, mas num meio termo que me é incomodativo. De resto, é um livro sobre a morte anunciada de um pai e tudo o que isso acarreta. Melhor, é sobre o que isso provoca em nós. É sobre a morte sempre prematura, mesmo aos 86 anos; sobre a eterna compreensão depois de anos de mágoas geracionais; sobre a decadência que colhe a sabedoria; sobre a genética dos sentimentos genéticos. Nisso, este livro é bom.

Desespero

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"Mas a verdade é que a amava por ela me amar."

"Por exemplo, era capaz de estar na cama com Lydia, desafiando as breves séries de carícias preparatórias a que teoricamente ela tinha direito, e de repente ter consciência de que o diabo da Cisão se tinha imposto."

"E o resto foi tudo inventado, a religião, a poesia... oh donzela, como sofro, oh, o meu pobre coração! Não acredito no amor. Já a amizade, isso é outra história. A amizade e a música."

"...um mundo em que o trabalhador que cai morto aos pés da sua máquina será imediatamente substituído pelo seu perfeito duplo sorrindo com o sorriso sereno do perfeito socialismo."

"Qual autor relendo a sua obra mil vezes, verificando e testando cada sílaba e no fim incapaz de dizer de aquele mosaico de palavras se é bom ou não, assim aconteceu comigo, assim aconteceu."

Expressões retiradas de Desespero de Vladimir Nabokov

Auto-desafio, entretém intelectual, auto-elogio, farpa inimiga aos clássicos (Dostoiévski sobretudo) e aos comunistas, desabafo. Um pouco de tudo isto vindo de uma história onde Nabokov parece apenas querer impressionar o leitor. Escarrapachar em cada linha o seu talento estudado. Pouco depois de começar, já nos contava que poucos escreveriam como ele, até porque ele tinha lido mil e dezoito livros entre 1914 e 1919. A história trata de um homem - um Nabokov fugido da realidade factual - que num delírio se convence de ter encontrado o seu duplo perfeito. Depois, a personagem, envolta numa êxtase narcisista e desassombrado, resolve assassinar o seu duplo e forjar a sua morte, talvez não tanto pelo prémio do seguro de vida - que serve de móbil assumido ao crime -, mas antes por exercício de superioridade intelectual. A procura do crime perfeito, ou talvez do super-homem de Nietzsche. Uma história que mistura a crítica à URSS e à cultura Russa com um romance introspectivo e intrincado; sempre salpicado de profundo talento e capacidade de subversão escrita e imaginária.

Façam o favor de comparecer

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Aos interessados, é só comunicarem!

A parva da Geração auto-intitulada de não parva

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Em relação ao texto de cloaca da senhora, apenas as considerações essenciais:

1º Não foram os que "se fazem de vítimas" que puseram isto como está.

2º Percebo perfeitamente que a geração da senhora espere ansiosamente que a nova geração a tire do buraco em que a geração dela nos pôs: a todos.

3º "É claro que os jovens tiveram azar no momento em que chegaram à idade do primeiro emprego." (risos) É um azar como outro qualquer este... É como receber um jornal num semáforo e apanhar ódio snob na primeira coluna.

4º "...aprender a um nível de ensino superior para mais, significa estar apto a reconhecer e a aproveitar os desafios e a ser capaz de dar a volta à vida" que como todos sabemos é a definição natural de licenciatura... Aliás, o que nós vemos é que quem não tem curso superior jamais consegue "dar a volta à vida" porque não estudou para isso. O Esforço, a dedicação, e a força de vontade foram as três cadeiras mais difíceis do meu curso por exemplo.

5º O primeiro parágrafo é genial. Mas concordo; de facto não aprendemos nada. É por não termos aliás aprendido que não há emprego, que existe uma precariedade no trabalho jovem enorme, que o desemprego nos jovens licenciados parece os Himalaias, que os impostos sobem, e que os nossos melhores alunos - aqueles que aprenderam alguma coisa - se vão embora. É natural. É que aturar a gratuitidade de opiniões destas num jornal, já de si, gratuito, é demais para quem não é parvo.

Das minorias parlamentares

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" E assim continuará a ser, até ao fim desta imprudente experiência minoritária, que se espera que sirva de lição e abra caminho à inscrição constitucional da sua impossibilidade..."

Sublinho o que diz aqui Carrilho, algo que também eu defendo há algum tempo em paralelo com um regime presidencialista. Na verdade, está mais que visto que isto assim não dá. E tudo o que for dar instrumentos reais para o exercício do poder é bem vindo. Em Portugal o regime só permite este ridículo "tacticista" porque somos de demasiados brandos costumes. O povo vota sempre pela inacção, nunca pelo espírito reformista, e isso mostra como em 35 anos de democracia, vivemos apenas 15 em maioria absoluta. O resto foi andar a empatar e a endividar. Gestos de sobrevivência política.

Obrigado

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Sei que vou ter saudades. Ao melhor jogador que vi jogar de verde e branco, o meu obrigado.

Fim de campanha. Começo de algo.

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Nobre saiu derrotado,até porque eu não concebo essas geometrias paralelas em que vários candidatos ganham as mesmas eleições. Mas isso, em nada retira o mérito da sua coragem, dos seus princípios de cidadania, da força motriz da ruptura que preconizava - e pela qual foi gravemente prejudicado em campanha - e, em última instância, de me ter feito votar em alguém, pela primeira vez, por profunda convicção.

Quero acreditar que estes princípios não colhem 14% dos nossos cidadãos, mas uma maioria alargada, e por vezes, as coisas começam assim.

Pobres mas ecológicos

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Tenho sido muito crítico das políticas do governo, particularmente no período mais recente. Contudo, e até porque a campanha que intermitentemente vem apoquentando as ruas me tem aborrecido, abro o ano - politicamente falando - com um elogio ao governo: o aparente sucesso da aposta nas energias renováveis.

Num certo programa do Esplanada Cidadania, e por exercício de coerência, referi que Portugal teria, pelas suas características geográficas, um claro trunfo no século XXI: as energias renováveis. Frisei aliás que esse poderia ser, desgraçadamente, o nosso único trunfo. Aqui chegados, é bem certo que Portugal não marca o passo de coisa nenhuma, nem define agendas, muito menos padroniza a energia-tipo utilizada na produção em massa dos dias de hoje. Contudo, a simples diminuição da dependência de combustíveis fósseis, e a consequente redução da famigerada factura energética, são, per si, factores de competitividade no longo prazo.

E se hoje, a energia verde está longe de ser barata, e por isso, eficiente, este é pelo menos um sector que reúne duas boas notícias; a saber: somos pioneiros, e esta apresenta tendências estratégicas no futuro.

As perturbações do pupilo Törless

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"... ajudam os jovens a caminhar sobre o terreno anímico, perigosamenete amolecido, destes anos em que temos de acreditar em nós, mas que estamos ainda demasiado imaturos para sermos de facto alguém com importância."

"Era a hora em que as pessoas se vestiam para algum encontro, ou resolviam ir ao teatro. E aseguir vai-se a um restaurante, ouve-se uma banda, fica-se um pouco num café. Conhece-se gente interessante. Uma aventura amorosa deixa no ar expectativas até ao amanhecer. A vida gira como uma roda mágica de onde saem sempre coisas novas e inesperadas..."

"Pois a primeira paixão adolescente não é amor por uma pessoa, mas ódio a todas as outras. Sentir-se incompreendido e não compreender o mundo não são coisas que acompanhem a primeira paixão, são, e isso não acontece por acaso, a sua única causa. E ela própria é uma fuga na qual o estar a dois mais não é do que uma solidão duplicada."

"Era a insuficiência das palavras que então o torturava, uma consciência vaga de que as palavras eram meros pretextos para aquilo que se sente." "Pouco a pouco o sonho foi abandonando Törless lentamente como uma colcha de seda que escorrega interminavelmente sobre a pele de um corpo nu."

Frases retiradas de "As perturbações do pupilo Törless" de Robert Musil

Este romance de Musil, o seu primeiro, acaba por ser um estranho texto ficcional, bastante duro - sem nunca ser profusamente descritivo - que retrata as incertezas e inseguranças de um qualquer pupilo de um colégio interno. O romance, ainda que seguindo uma linha cronológica, não tem uma história enraizada do princípio ao fim. Ainda assim, e incutindo algum terror temerário no leitor, acaba por prender a atenção. A escrita é rica, com vocabulário a aprender, e uma fluidez narrativa que, tendo em conta que foi um livro de estreia, impõem respeito. De resto, tem a marca de Musil, onde vale a pena depararmo-nos com as descrições psicológicas das personagens, e o detalhe - quase obsessivo - com o qual todo o romance se parece dedicar a esse mundo interior. Um pouco duro de ler, mas compensador.

Fábulas e alegorias políticas

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Recomendo vivamente a leitura do famoso Animal Farm de George Orwell bem como da fábula de Pepetela, A Montanha de Água Lilás. No primeiro, temos a URSS escarrapachada de modo sublime, desde a luta de egos entre Estaline e Trotsky, até à invasão Nazi passando alegoricamente por inúmeros aspectos da história, escamoteados de forma desarmante.


No segundo livro, trata-se de uma fábula curta que visa enaltecer a importância moral da resistência e da integridade, quer individuais quer colectivas. Ambas usam sociedades animais para retratar esta, tão mais animalesca - a humana- com inteligência e uma certa elegância expressiva.

P.S. Fruto da gentileza de um grande amigo, tenho aí uma edição antiga do Admirável Mundo Novo. Assim que o "despache", também aqui comunicarei. Entretanto, segue a luta com (nunca contra) as 1070 páginas em letra miúda de Guerra e Paz.