A Fábula

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"...fora permitido ao filho alistar-se no dia seguinte, e em Agosto foi enviado para a Bélgica e passadas três semanas já fora dado como desaparecido em Mons, e isso foi aceite por todos excepto pelo pai, que pediu à firma de advogados uma licença sem vencimento para sair e se alistar, e estes concederam-na por que pensaram que ele nunca conseguiria ser aprovado nos exames médicos. Oito meses depois, também o pai estava em França. Um ano depois ainda estava a tentar, primeiro conseguir uma licença para se ausentar; depois, quando isso falhara, a tentar a transferência para alguma unidade suficientemente próxima de Mons para procurar o filho, embora já se tivesse passado muito tempo desde que se referira a ele, como se tivesse esquecido o motivo por que estava ali e se lembrasse apenas do destino..."

"A guerra é um episódio, uma crise, uma febre cujo objectivo é livrar o corpo dessa mesma febre. Assim o objectivo da guerra é acabar com a guerra. Sabemos disso há seis mil anos. O problema é que demorámos seis mil anos a aprender a fazê-lo."

"Porque eles não acreditavam que a guerra estivesse terminada. Decorria há demasiado tempo para cessar, para acabar, de uma noite para a outra, com um mero aviso, e daquela maneira. A guerra limitara-se a prender-se em si mesma; não os homens envolvidos nela, mas a guerra em si, guerra, insensível e até desatenta à angústia, à carne rasgada, a toda a mesquinha vaga e revoada de vitórias e derrotas como o enxamear e rodopiar de insectos..."

"...três mil homens que tinham salvo a França e o mundo iriam perder as suas vidas, não no próprio acto, mas apenas depois do facto, de modo que, para homens que tinham salvo o mundo, o mundo que tinham salvo não merecia o preço que tinham pago por ele..."

Excertos da obra A Fábula de William Faulkner

A aclamada obra de Faulkner, vencedora do Pulitzer e do National Book Award, chegou-me às mãos numa edição relativamente recente da Casa das Letras, que me convenceu, muito por culpa da chancela de Nobel que o autor carrega. Nestas coisas da leitura, vou tendo os meus princípios. Um deles é desconfiar da literatura Norte-Americana. Para o caso, não fez mal; arrisquei. Foi talvez por escolher um obra multi-premiada que tenha arriscado, mesmo sem nunca ter lido Faulkner anteriormente.

A primeira impressão foi desafiante. Uma leitura densa, em jeito de romance histórico, um tanto desligado e de parágrafos prolixos. Nada que assustasse a minha tolerância; que é coisa de 50 a 70 páginas, mas na verdade, o livro nunca mudou. Foram 330 páginas de boas passagens, desusadamente introspectivas para um escritor não Europeu - e este é um ponto que saúdo -, sem que a história me parecesse cabalmente una, nem tão pouco premeditada. Ou seja, se por um lado é bom haver um livro bem escrito sobre a Primeira Guerra Mundial, tão esquecida em função da Segunda, por outro lado é uma pena a lógica narrativa tão intrincada, de onde dificilmente se apanha o fio condutor.

Confesso que o fim não me deu qualquer prazer, antes alívio, mas certamente estarei em desacordo com quase todos os que lerem a obra, e por isso, em consciência, aqui fica a sinopse do editor.

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