O prometido é devido; assim sendo lancemo-nos na dissecação da Arte tal como Nikolai Gógol a meditou: conceito, percurso e ameaças.
Conceito de Arte
Para ser Arte não basta ser qualquer objecto que nos desperte curiosidade. Segundo Gógol, a Arte necessita do engenho do artista e acima de tudo necessita do artista. Da alma do artista! Para Gógol o artista tem de estudar artes para explanar no belo os sentimentos e impressões íntimas, os seus conceitos pessoais, o calor humano das sensações. Quando Gógol pensou na Arte, no seu espaço e suas expressões e qualidades indissociáveis, pensou que um quadro inacabado feito com total entrega do artista é mais arte que a mais bela das paisagens friamente retratadas.
Percurso do artista, alcançar a Arte
No entender de Gógol o artista alcança a plenitude quando a sua concentração na obra tornou o seu mundo hermeticamente fechado. Ser artista não é um trabalho das nove às cinco, é viver no mundo da Arte. Para além do enfoque dado à concentração, Gógol não despreza o conceito de talento, bem pelo contrário, tem-no como o aspecto “mágico” que distingue. Gógol diz mesmo que sem talento a arte torna-se o “artesanato da arte”.
Ameaças à Arte
De facto, para além do seu mundo místico e do seu estupendo talento literário, Gógol, pese o facto do seu obscurantismo religioso, era um escritor com grande visão. Por isso, em “O Retrato” estabelece todo um conjunto de perigos que rodeiam o artista, ameaçando assim a Arte. Todos eles são de incrível actualidade, e alguns bem mais patentes nos nossos dias do que no São Petersburgo do séc. XIX. Destaco o perigo da social, o perigo do crescimento e o perigo económico. O perigo social consiste na pressão de que o artista é vítima. Assim, a moda e a ignorância artística do público pressiona a que a Arte se estandardize, ou por outra, se desconstrua enquanto expressão do artista. A pressão popular leva ainda à produção em série de obras, algo contraditório ao que definimos como conceito de Arte. O perigo económico está também muito ligado ao social. A situação económica influi nos estados de alma do artista. Um estado de pobreza levará a produzir o que outros querem em detrimento de si próprio. Os estados de riqueza são um incentivo ao ócio e à perda de virtude, implicando uma fuga ao mundo hermeticamente fechado da Arte. No caso descrito em “O Retrato” o artista pobre torna-se miraculosamente rico e procurando alcançar cada vez mais riqueza distancia-se da Arte e cola-se às modas da alta sociedade. Por fim o perigo do crescimento está associado ao amor pelas riquezas, à perda de espontaneidade, ao conformismo, ao egoísmo e ao endurecimento do coração. Em Gógol esta ideia está sublimemente expressa e identifica o quão difícil é ser artista sem reservas ao longo de uma vida inteira.
Considerações sobre arte: O contributo de Gógol
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