O Pendura

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"Quando nos dão um beijo é bom prevermos de imediato o instante em que vamos apanhar a bofetada."

"Ia a casa deles com a certeza de impressionar e o temor de não ser compreendido."

"Sou arrastado pela regularidade das suas vidas, e nada tento para voltar atrás."

"Só para nos deitarmos com uma mulher, para lhe amassarmos o corpo como um padeiro, com Hãs!, Hãs! guturais e surdos, vencemos o nosso desprezo."

"Sinto bem perto a minha habitual inimiga a espreitar-me: a tristeza sem causa."

"(...)porque chamamos "minha mulher" a essas queridas de um só noite, e assim brincamos às famílias e ficamos com ar de quem se vê obrigado a suportar encargos."

"Só sei dizer frases sentenciosas sobre a vida, as suas canseiras infinitas, os seus baços desesperos, e sobre o desacordo que há entre os factos e os nossos sonhos."

"Não vejo Madame Vernet; vejo a situação que arranjámos, a vida que se prepara e os seus acontecimentos possíveis, o adultério que vai ser preciso consumar."

"Que apetite de carne é este, surgido de repente e que passa antes de ser satisfeito?"

"O primeiro amor de uma rapariga decorre em exercício, e o último amor de uma mulher madura em palavras."

"Uma mulher que envelhece precisa de recordações."

Frases do livro O Pendura de Jules Renard

Um dos primeiros romances de Renard, esta obra vagueia entre Paris e a costa francesa onde os endinheirados passavam longos períodos de férias. Trata-se de uma história onde a personagem principal, geralmente na primeira pessoa, relata a proximidade parasitária a que se devota a uma família locupletada pelas actividades do marido. Os burgueses endinheirados acabam por adoptar este poeta de versos avulsos, e ele, numa necessidade que nos aparece ao longo de todo o livro, acaba por estudar a forma de se pendurar no regaço da família, subir na consideração dos familiares, e até tratar dos dinheiros da casa. Paralelamente a isso, um concupiscente interesse cresce em primeiro lugar pela mulher, Madame Vernet,e em segundo lugar pela sobrinha. O livro é pontuado por situações que as notas de rodapé explicam como actuais à época. Também em certos momentos, sentimos que o pendura pode ser o próprio Renard, ainda que num ambiente fantasiado. A escrita pareceu-me muito francesa. Com uma temática próxima do escandaloso Madame Bovary, pouco antecedente a este, e com uma descrição psicológica muito mais assente na fragilidade e boçalidade das personagens do que por exemplo, as abruptas descrições eslavas. Também no cuidado descritivo da natureza vemos bem presente a literatura de Renard. A divisão, em capítulos curtos e intitulados, quase lembrando as indicações cénicas do teatro (género que o próprio cultivou), completa um conjunto de características que faz deste romance de moralidade errante, pouco escrupulosa, e com lampejos de uma tristeza cava, um livro que quase serve de compêndio aos traços mais característicos da escrita de Renard. Muito bom para os amantes da literatura francófona.

Deixem-me também destacar, porque não é a primeira vez que leio um livro excelente da Assírio & Alvim, a qualidade da edição. Excelente capa, (é a que podem ver na figura), bom papel, e sempre algumas informações adicionais dobre a obra. Para além de publicar autores actuais que vencem prémios e vendem na medida certa, também nas colecções clássicas destacam-se como de topo.

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