Apesar de me encontrar ausente no estrangeiro, como aliás é sabido da comum parte de leitores deste blog, acompanho com o maior detalhe que a distância me concede os acontecimentos que passam em Portugal. Esta condição tem levado a que o blog verse menos sobre a actualidade do que eu próprio desejaria, contudo, e infelizmente, parecem haver temas graves demais para até o mais foragido dos forasteiros se alhear. Falo-vos do “Caso Freeport”. Não tanto do caso em si, esse em investigação e segundo a Procuradoria-geral da República sem arguidos nem suspeitos, mas de todas as implicações e considerações lamentavelmente maquiavélicas que o cidadão atento vislumbra.
Este caso tem duas particularidades que não podem passar incólumes. A primeira prende-se com o facto de envolver da forma mais directa possível (judicialmente) ou da forma mais rebuscada (mediatização jornalística, alguma até mal intencionada) o Eng.º José Sócrates. Até aqui nada me tiraria o sono. A mim e a qualquer cidadão de verdade. A gravidade, num Estado de Bem seria até mesmo um tumulto, é que neste caso, referir Eng.º José Sócrates é tristemente dizer o Sr. Ministro do Ambiente e o Sr. Primeiro-Ministro de Portugal. Chegados aqui parece-me essencial reflectir. Até que ponto está a imagem do cidadão dissociado da imagem do cargo? Pura e simplesmente não está porque, a ser verdade, e nunca é demais relembrar que não há arguidos e que legal e eticamente existe a presunção da inocência, os ilícitos foram cometidos tendo como veículo o poder que os ditos cargos conferem. O simples facto de poder ser aceite socialmente e de forma pacífica que isto pode acontecer, é o mais arrepiante estandarte da queda civil da nossa democracia. Quando o comum cidadão não se choca com o arrepio das regras mais básicas e crê numa possibilidade tão vil é o sistema e a sua coesão que está posta em causa.
A segunda particularidade do caso é o seu carácter cíclico. Chega a nós como um cometa encalhado na Via Láctea que só e apenas aparece sempre que há eleições. Como se uma força, que num Estado de Direito só pode ser sinistra, reacendesse com interesses em circunstância alguma nacionais ou justos o caso. E é de Justiça que estamos a falar. Que máquina paira sobre nós? E que poder monstruoso é este de deturpar o Estado e os seus poderes, desde 1820 estabelecidos? Qual a sua falta de pudor e de escrúpulos? Inquietações de um cidadão que não vê sempre as notícias pelo mesmo canal…
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