Grossas largas de enervamento e de tristeza corriam-lhe pela cara. Mas por causa das rugas, não caíam. Dividiam-se, juntavam-se e formavam uma máscara de água nessa cara arruinada.
Pensei que era domingo, o que me aborreceu: não gosto dos domingos. Então voltei-me na cama, procurei na almofada o cheiro do sal que os cabelos de Maria ali tinham deixado e dormi até às dez horas. Fumei depois alguns cigarros, sem me levantar, até ao meio-dia. Não queria ir como de costume almoçar ao Celeste porque me fariam com certeza perguntas, e eu detesto que me façam perguntas.
(...)soubera da morte da minha mãe, mas que era uma coisa que, mais dia menos dia, tinha de acontecer. Era essa, também, a minha opinião.
(...)perguntou-me se eu a amava. Respondi-lhe que isso nada queira dizer, mas que me parecia que não.
Afastei-me com Maria e sentíamo-nos os dois de acordo, nos nossos gestos e no nosso contentamento.
Voltei então a disparar mais quatro vezes contra o corpo inerte, onde as balas se enterravam sem dar por isso. E era como se batesse quatro breves pancadas à porta da desgraça.
Compreendi, então, que um homem que houvesse vivido um único dia poderia sem custo passa cem anos na prisão. Teria recordações suficientes para não se maçar.
Quando, um dia, o guarda me disse que estava preso há cinco meses, acreditei, mas não compreendi.
Mas todos sabem que a vida não vale a pena ser vivida. No fundo, não ignorava que morrer aos trinta ou aos setenta anos tanto faz, pois, em qualquer dos casos, outros homens e mulheres viverão, e isso durante milhares de anos.
Pensei que era domingo, o que me aborreceu: não gosto dos domingos. Então voltei-me na cama, procurei na almofada o cheiro do sal que os cabelos de Maria ali tinham deixado e dormi até às dez horas. Fumei depois alguns cigarros, sem me levantar, até ao meio-dia. Não queria ir como de costume almoçar ao Celeste porque me fariam com certeza perguntas, e eu detesto que me façam perguntas.
(...)soubera da morte da minha mãe, mas que era uma coisa que, mais dia menos dia, tinha de acontecer. Era essa, também, a minha opinião.
(...)perguntou-me se eu a amava. Respondi-lhe que isso nada queira dizer, mas que me parecia que não.
Afastei-me com Maria e sentíamo-nos os dois de acordo, nos nossos gestos e no nosso contentamento.
Voltei então a disparar mais quatro vezes contra o corpo inerte, onde as balas se enterravam sem dar por isso. E era como se batesse quatro breves pancadas à porta da desgraça.
Compreendi, então, que um homem que houvesse vivido um único dia poderia sem custo passa cem anos na prisão. Teria recordações suficientes para não se maçar.
Quando, um dia, o guarda me disse que estava preso há cinco meses, acreditei, mas não compreendi.
Mas todos sabem que a vida não vale a pena ser vivida. No fundo, não ignorava que morrer aos trinta ou aos setenta anos tanto faz, pois, em qualquer dos casos, outros homens e mulheres viverão, e isso durante milhares de anos.
Recomendo O Estrangeiro a todos aqueles que se conseguem pasmar com a diferença e a singeleza estilísticas. O conteúdo profundamente "absurdista" impede muitos de o apreciarem, mas para mim, foi dos livros mais interessantes que li até hoje. Uma obra. Tão bem escrita no conteúdo como desenhada na forma. A ler.